quinta-feira, 28 de abril de 2011

Clarice Lispector - Água Viva

"Quando se vê, o ato de ver não tem forma - o que se vê às vezes tem forma, às vezes não. O ato de ver é inefável. E às vezes o que é visto também é inefável. E é assim certa espécie de pensar-sentir que chamarei de "liberdade", só para lhe dar um nome. Liberdade mesmo - enquanto ato de percepção - não tem forma. E como o verdadeiro pensamento se pensa a si mesmo, essa espécie de pensamento atinge seu objetivo no próprio ato de pensar. Não quero dizer com isso que é vagamente ou gratuitamente. Acontece que o pensamento primário - enquanto ato de pensamento - já tem forma e é mais facilmente transmissível a si mesmo, ou melhor, à própria pessoa que o está pensando; e tem por isso - por ter forma - um alcance limitado. Enquanto o pensamento dito "liberdade" é livre como o ato de pensamento. É livre a um ponto que ao próprio pensador esse pensamento parece sem autor.

O verdadeiro pensamento parece sem autor.

Clarice Lispector. Água Viva.

Elabore dissertação acerca da afirmação "o verdadeiro pensamento permanece sem autor."

"O verdadeiro pensamento parece sem autor" insere-se na incessante impossibilidade de apreensão do real, sempre incompleto e fugidio. Clarice Lispector produz uma obra ao modo de uma invocação literária que nos remete à reflexão sobre o tempo, o ser e a linguagem. O objetivo da autora em seu texto-suma "Água Viva" foi a sondagem de mecanismos psicológicos e a busca para o nível da palavra por percepções difíceis de serem transpostas ao nível da linguagem.

A afirmativa de que o verdadeiro pensamento parece sem autor remete-nos à transfiguração da realidade no universo literário de Clarice Lispector, que considera os pensamentos reais como aqueles que indagam um saber filosófico, que faz o ser humano voltar-se a si. Uma busca pela ancestralidade, a procura pelo "it" (objeto que pulsa vida. A autora aponta frequentemente para a questão da comunicação pela via da palavra como indivisível e intraduzível, que escapa constantemente à compreensão. O significante que permeia um futuro "vir a ser" da linguagem.

O pensamento verídico é não autoral devido ao potencial dele em tornar-se a personificação do grito de uma fera. A última obra de Clarice Lispector, produzida três anos antes de sua morte é uma celebração à vida, a todas as forças universais e reflexões mais íntimas do sujeito.

Dessa maneira, esse pensamento que não quer ter nome, não deseja autoria, traz inúmeras ponderações sobre o tempo presente, o instante comparado à roda do carro, que, ao tocar o chão já se transformou em outro instante e o anterior já é passado.

Em termos conclusivos, o objetivo da autora em sua obra era alcançar o fluxo atráves de um texto poético, intenso e vibrante. A autora afirma que gênero já não a pega mais, da mesma maneira como afirma que o verdadeiro pensamento não necessita autor. A intenção é chegar no "é" da coisa, alcançar seu "it" e, para isso, denominações são descartadas.

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